domingo, 25 de março de 2018

LENÇO DE SEDA


Ilustração: obra de An He


LENÇO DE SEDA 


Assisto ao parto
Das palavras doutas 
Seduzido p' los teus olhos 
E o teu rosto de lua 
Gatos pardos e velhos 
Acariciam-me as pernas 
Trémulas pelo temor 
De não entender o mundo 
E a paixão do teu amor 
Resta-me o lenço de seda 
Chinesa, p' ra limpar a alma 
Enquanto não se põe o sol 
E a noite acorda os sapos 
Verdes ávidos de chuva 
Resta-me o silêncio! 
E a memória do teu beijo 
Daquela noite escura 
De novembro 
Resta-me o rosto 
Pintado pela cor 
Esbatida do teu batôn 
Agora! 
Tudo está consumado 
Definitivamente 
Num gole da última gota 
Saboreada divinamente 
De uísque velho escocês 
Eu penso no amor! 
Essa palavra ancestral 
Que mata corações 
Frágeis e rouba a vida 
Agora restam ilusões 
Tudo está consumado 
E, eu estou de saída 
Serenamente, enamorado 
Pelo secreto mistério 
Por Deus criado 
E por este poema 
Que escrevi inspirado 
P' ra limpar as lágrimas 
Desta eterna tristeza 
Resta-me o teu lenço 
De seda chinesa. 

Joaquim Jorge de Oliveira