sábado, 27 de novembro de 2021

"A CRIANÇA..."


COROA de SONETOS "A CRIANÇA..."


Autores: ARIEH NATSAC, Ró Mar e RAADOMINGOS




A criança que fui chora na estrada.

 de Fernando Pessoa


A criança que fui chora na estrada.
Deixei-a ali quando vim ser quem sou;
Mas hoje, vendo que o que sou é nada,
Quero ir buscar quem fui onde ficou.

Ah, como hei-de encontrá-lo? Quem errou
A vinda tem a regressão errada.
Já não sei de onde vim nem onde estou.
De o não saber, minha alma está parada.

Se ao menos atingir neste lugar
Um alto monte, de onde possa enfim
O que esqueci, olhando-o, relembrar,

Na ausência, ao menos, saberei de mim,
E, ao ver-me tal qual fui ao longe, achar
Em mim um pouco de quando era assim.

Fernando Pessoa

*****

"A CRIANÇA..."


I

 "A criança que fui chora na estrada,"
Descolorida por via d' incompreensão,
Por colo, histórias ou contos de fada,
Enfim, por afagos de coração!

Tantos momentos por viver! O senão
Por adiante, o universo de tanto e nada,
Onde não há lugares d' eleição,
Viagem que se prossegue encavacada!

Ah, hoje sinto um pesar de crescer 
De não me ter despedido, do sobrevoo,
Do que ainda poderia ter d' aprender!

Continuo! Pois, o tempo dela acabou,
Foi o pai e a mãe, sem ninguém par' a proteger!
"Deixei-a ali quando vim ser quem sou."

© Ró Mar
 
*

II

"Deixei-a ali quando vim ser quem sou";
Tarde cheguei, partiu, foi-se embora.
Só encontrei a sombra do que lhe restou,
Até o que ficou dissipou-se na hora.

A inocência, a que por ora ainda chora;
Culpa p'lo que cedo nela embrenhou!
Naquela esquina, sem muita demora
A rua fez sina, que sorte lhe calhou!

Até que não foi tão trágico assim!
Houve outros momentos, que acompanhada
Me senti a mais bela flor do jardim!

Entretanto, nas voltas da vida deixada,
Ergo os cacos, construo o meu botequim,
"Mas hoje, vendo que o que sou é nada."

© RAADOMINGOS

*

III

 
"Mas hoje, vendo que o que sou é nada,"
Porque é que tanto construi e amealhei;
Se o que se leva para a outra morada,
É só o que desta vida gozei?

Tarde, já tarde aprendi e agora sei;
Não vale caminhar em outra estrada;
Fosse antes quando nasci e me criei;
Seria diferente a minha passada!

Viveria, a existência seria d' outra forma.
Daria amor, que não soube por onde andou!
Usaria o coração como plataforma.

Se concederem tempo ao corpo que restou,
O homem que em criança agora o transforma;
"Quero ir buscar quem fui onde ficou"!

© RAADOMINGOS

  *

IV 

"Quero ir buscar quem fui onde ficou"
Vestida de cinzento em tom raiado
Trazendo no seu manto o que levou
Lampejo que apagou céu estrelado

Mostrando a virtude que deu flor
Raios de encantamento desbravado
Hossana por se achar o vencedor
De tudo que alcançou e foi criado

Quando em presença estou; de fino oiro
Converte a natureza num tesoiro
Que nem a tirania sublevou…

Salta e pula risonha uma criança
Esquece a tempestade e vê bonança
"Ah, como hei-de encontrá-lo? Quem errou"

© ARIEH NATSAC

*

V

"Ah como hei-de encontrá-lo. Quem errou"?
Perdido sem saber qual o caminho
Fruta amarga, semente, desfrutou
Agora vai debicando, mas sozinho

De asa ferida envolta em mistério
Como um livro que não tem e se aguda
Na paisagem p’ra lá do ser etéreo
Que tanta, tanta vida nos desnuda

Nas passadas pisadas ao relento
Que a noite é sombria onde esquento
O corpo que se levanta sem ter nada

Na nevoa lisonjeira que trespassa
Sem ter espada sem haver mordaça
"A vinda tem a regressão errada."

© ARIEH NATSAC

*

VI

"A vida tem a regressão errada"
Já nunca poderei voltar atrás
Sendo aquela criança transviada
Que mantinha por lema, bom rapaz

Era azougado e grande folião
Das horas destemidas sem segundos
Saltava tanto abismo à condição
Percorrendo os lugares mais profundos

Contra as hostilidades de uma vida
Que lhe foi à nascença prometida
Mas que tão depressa aproveitou

Para fazer o prumo da idade
Rumando sem conceito da verdade
"Já não sei de onde vim nem onde estou".

© ARIEH NATSAC

*

VII

 "Já não sei de onde vim nem onde estou,"
Na ausência desmedida espero o sossego
Do meu desassossego, sei que sou
Parte dum tempo de pouco aconchego!

S' ao menos encontrasse o desapego
Ao que já não é, nos meandros do que sou!
No silêncio ensurdecedor a que chego,
A pausa merecida, meu ofego dou!

Ah, era meio caminho par' a claridade
Desta minha existência conturbada,
Por tal escassez de infância e puberdade!
 
E, se soubesse encontrar uma pousada
De bússola pronta, achar-me-ia na idade!
"De o não saber, minha alma está parada."

© Ró Mar 
 
*

VIII

"De o não saber, minha alma está parada."
Perdida no sossego da razão
Que a leva com saudade de ser nada
Solta faz-lhe sangrar seu coração

Caminho no restolho em muita vida
Pássaro procurando o seu raminho
Da mocidade já muito sumida
Que ao longe vai e acena de mansinho

No escuro calendário sem ter folhas
Reserva de atitude de recolhas
São tantas as vontades de voltar

Com sorte do princípio, tanto queria
Tudo e nada não sei perguntaria?
"Se ao menos atingir neste lugar"

© ARIEH NATSAC

*

IX

  “Se ao menos atingir neste lugar”
Serei tanto feliz como criança
E não vou p’ra ninguém localizar
O sintoma que tem a dor da esperança

É um barril de pólvora a pobreza
Que mata lentamente sem receio
Perdendo a confiança de uma mesa
Sendo pobre palavra desse meio

Na barrela dos olhos vejo aceso
O fogo que arde sem um contrapeso
Sem fazer desta vida um tal festim

Onde se roem ossos sem ter carne
Será onde não há quem encarne
“Um alto monte de onde possa enfim”

© ARIEH NATSAC

*

X

 "Um alto monte, de onde possa enfim"
Descansar, olhando o céu por horizonte,
Que me é íntimo! Sentir-me-ei querubim
A renascer das raízes em pura fonte!

Lá do alto, olharei por todos aqueles,
Que como eu ficaram, enquanto crianças,
A olhar estrelas! O que é feito deles?
Será que ainda vivem nas esperanças?

Os que jogavam ao balão na praça
Eram amigos á séria e é de recordar
O pé descalço e a mão numa carcaça! 

Ah, hoje o meu destino fez-me parar
E ver aquele tempo de (des)graça!
"O que esqueci, olhando-o, relembrar"!

© Ró Mar 

*

XI

"O que esqueci, olhando-o, relembrar,"
O bocado da serra manto frio
Perdi naquele tempo meu olhar
Na delícia presente, desvario

E a pobre gente avança sem ter medo
Como se uma criança fosse ao tempo
Na imensidão joga com segredo
Que brota do seu corpo sem lamento

Esta pequena figura é um homem
Que brota desta terra feita mãe
Que ensinando sem livros sendo assim

Rasgando-lhe a pele abrindo a dor
Com palmos a crescer o seu valor
"Na ausência, ao menos, saberei de mim"

© ARIEH NATSAC

*
 
XII

"Na ausência, ao menos, saberei de mim,"
Astrolábio dos meus sentidos mediando,
Tal Pessoa, altura mediana; meu latim,
Que nem eu compreendo, vou arquitetando!

Poucas filosofias, que a vida é barata
E as letras saem-me caras; ainda lembro
D' escrever umas palavras em cascata
Na lousa carcomida, não era dezembro!

Ah, hoje é tudo fino e eu desatino!
Não que não tenha tino, mas, se vou julgar
O que sou não envergonho o menino...

Do qual estou equidistante a procurar
P'lo verbo qu' abrilhante o destino;
"E, ao ver-me tal qual fui ao longe, achar."

© Ró Mar

*

XIII

"E, ao ver-me tal qual fui ao longe, achar"
Tudo o que vale a pena em toda a criança,
Que tal como eu não pôde celebrar;
Quiçá, mudar de pensar, autoconfiança!
 
    Ah, que tolice! Eu, a pensar em mudar
Toda aquela existência, análoga à minha,
Num tempo que me foge! Teimo em viajar
E encontrar o melhor de mim na estrelinha!

E, enquanto a comtemplo sinto, o paraíso!
Quaisquer cousa, nem sei bem o quê? Enfim,
A idade é minha e eu menino de juízo!

Parece amanhecer, cheirinho a alecrim,
Outro dia a inaugurar o sorriso
 "Em mim, um pouco de quando era assim."

© Ró Mar 

*

XIV

"Em mim um pouco de quando era assim"
Deixando tanta e impressa a saudade;
Na zoada que o vento faz, enfim;
Escuto o frescor da ida mocidade.

Pudesse encontrar-me - Piedade!
Oh vida, que subiria outro patim!
A criança some-se com a idade;
A percepção que chega é a do fim!

Em registo desbotado dum desenho;
Ecos áureos da verde gargalhada,
P'las nesgas frestas julgo qu' a detenho!

Agora que a reclamo não encontro nada;
As lágrimas pela face não as contenho,
"A criança que fui chora na estrada."

© RAADOMINGOS
 
*

COROA de SONETOS "A CRIANÇA..."

Autores: ARIEH NATSAC, Ró Mar e RAADOMINGOS

*

Sonetos do Universo | 2021

sexta-feira, 26 de novembro de 2021

ATIRA-ME AO VENTO




Atira-me ao vento


Atira-me, meu amor,
ao vento norte,
ao siroco, ao sudoeste,
aos ventos que mais sopram
em Portugal,
minha pátria inquieta,
sempre ancorada
nos destinos
de qualquer viagem
ou dá-me inteiro
às nortadas frias
num qualquer sonho
de delírios acordados
ou adormecido
nos ventos quentes
e deixa-me sozinho
nas areias cálidas
a norte do longe.
Arrastai-me ventos
que eu não tenho velas,
sou todo quilha
e mastros nus,
uma nau feita tempo.
Abraça-me depois
nos oceanos todos,
exuberante,
que eu sou Portugal
e vou com qualquer vento.
Atira-me, amor, ao vento.

© António F. Martins

quinta-feira, 25 de novembro de 2021

LISBOA, MEU BERÇO, MEU MAR.


Fotografia de Ró Mar 


LISBOA, MEU BERÇO, MEU MAR.


Menina, mulher, canção
Do dia, noite de sonhar;
Colar rente ao coração.
Lisboa, meu berço, meu mar.

Histórias, lendas e contos
Por viver e por contar,
Quase sempre prontos.
Lisboa, meu berço, meu mar.

Menina de sete saias,
Tuas colinas d' encantar,
Por olhar as belas praias.
Lisboa, meu berço, meu mar.

Minha pátria, una canção,
Por feito de namorar
O Tejo em toda a extensão.
Lisboa, meu berço, meu mar.

Mar e Mar. Não há terra igual
P'ra nascer, viver e amar,
Que a capital de Portugal.
Lisboa, meu berço, meu mar.

Ah, Menina tão brejeira
E senhora de seu ar!
Quatro estações e bandeira;
Lisboa, meu berço, meu mar.

O 1º rei de Portugal,
D. Afonso Henriques, louvar
P'lo reino da capital;
Lisboa, meu berço, meu mar.

Farol, língua de Camões,
Pelo universo a navegar,
Jus às condecorações;
Lisboa, meu berço, meu mar.

Os teatros ricos tesouros,
Jardim da Estrela belo ar;
É arte a praça de Touros!
Lisboa, meu berço, meu mar.

Mar e Mar. Não há terra igual
P'ra nascer, viver e amar,
Que a capital de Portugal.
Lisboa, meu berço, meu mar.

Do Castelo ao Terreiro
Dom João II foi morar,
Por olho no dinheiro;
Lisboa, meu berço, meu mar.

Salvé os descobrimentos!
Paço da Ribeira e o mar,
Torre - conhecimentos;
Lisboa, meu berço, meu mar.

Ah, feitos fenomenais!
Ponto de partida ao mar,
Vasco da Gama e outros tais;
Lisboa, meu berço, meu mar.

Porto de Lisboa tão ouro
E especiarias a engordar
A cidade do tesouro!
Lisboa, meu berço, meu mar.

Mar e Mar. Não há terra igual
P'ra nascer, viver e amar,
Que a capital de Portugal.
Lisboa, meu berço, meu mar.

Dom João V, de seu jeito
Grandioso, quis ofertar
O aqueduto a preceito!
Lisboa, meu berço, meu mar.

Das águas livres nascer
Fontes para iluminar,
Monumentais, de se ver!
Lisboa, meu berço, meu mar.

Do terramoto há memória,
Do Marquês o renovar;
Pombalina e arcada, glória;
Lisboa, meu berço, meu mar.

Chiado dos grãs literatos,
Cinema e tela a encantar
Preto e branco dos retratos;
Lisboa, meu berço, meu mar.

Mar e Mar. Não há terra igual
P'ra nascer, viver e amar,
Que a capital de Portugal.
Lisboa, meu berço, meu mar.

Bairros lisboetas são fado,
Cunho português a trinar,
Aqui e em todo o lado;
Lisboa, meu berço, meu mar.

Os ares dos miradouros,
E os baloiços d' embalar,
Miragens, meus tesouros!
Lisboa, meu berço, meu mar.

Menina de salto alto
Por alfama a passear
E também p'lo bairro alto!
Lisboa, meu berço, meu mar.

Varina da Madragoa,
Petinga fresca, a saltar,
Velha canoa qu' apregoa;
Lisboa, meu berço, meu mar.

Mar e Mar. Não há terra igual
P'ra nascer, viver e amar,
Que a capital de Portugal.
Lisboa, meu berço, meu mar.

Monumentos, catedrais
E outros tais de pasmar,
Arte anciã, belos vitrais!
Lisboa, meu berço, meu mar.

Arte equina de gabarito,
Puro Lusitano a galgar
Lezírias, porte bonito!
Lisboa, meu berço, meu mar.

Azulejos com história
P'ra contar, azulejar
Mundo afora, nossa glória!
Lisboa, meu berço, meu mar.

Menina, calçada, riqueza
De Portugal; sereia, mar
Do meu coração; Princesa!
Lisboa, meu berço, meu mar.

Mar e Mar. Não há terra igual
P'ra nascer, viver e amar,
Que a capital de Portugal.
Lisboa, meu berço, meu mar.

© Ró Mar | 2021

domingo, 21 de novembro de 2021

A VIDA EM MOVIMENTO


A VIDA EM MOVIMENTO


A madrugada acorda mais um dia,
Neste final de Outono acinzentado,
Com sol meio encoberto, envergonhado,
Entre a densa neblina, se anuncia!

O frio surge encolhido e agasalhado,
A fumegar por entre a aragem fria,
Com um sabor e cheiro a maresia,
Que o vento vai buscar ao mar salgado!

Vê-se e sente-se a vida em movimento,
Num rotineiro e firme crescimento,
Com a ajuda da água, o sol e o ar!

Assim, eu encantado espectador,
Da bela Natureza em seu melhor,
Nela descanso atento o meu olhar!...

© J. M. Cabrita Neves | 2021

sexta-feira, 19 de novembro de 2021

DÁLIA FLOR


DÁLIA FLOR


Assim como as flores abrem as suas pétalas para receberem o orvalho
Eu abro o meu coração para que as flores da amizade jamais percam o perfume
E nunca sejam trocadas pelas mãos frias do esquecimento!
Abro a porta lá está ela
Bonita e singela!
Pétalas abertas esperando no chão,
Juntinho ao meu portão!
Trouxera-a o vento beijando-lhe a face,
Empurrando de mansinho,
Para que eu a visse!
Alargo o passo salto com cuidado,
Não piso o encanto de tão belo achado.
Pego com delicadeza tão formoso exemplar;
Como podia tanta beleza, no chão, minh' alma ignorar?
Em minha mão aconchego, aquela que me veio beijar;
Dália, flor encanto;
Perfeição, numa jarra... num lugar!

© RAADomingos | 11/2021

quinta-feira, 18 de novembro de 2021

"ENTRE O SONO E O SONHO"




"Entre o sono e o sonho"


Entre o sono e o sonho
Há grande diversidade
Talvez, um elenco... suponho
Com certa casualidade!

No sono, acorda-se a voar
Pelas nuvens no firmamento
E, num sonho d'encantar
Alegra-se este momento.

A sonhar encontra-se a rima
Para a poesia acrescentar
Em resquícios de obra-prima,
Num palco a representar...

Entre o sono e o sonho
Uma viagem pelo mar
Um temporal medonho
Que nos convida a chorar...

Pesadelos em apatia
São marasmos, são tormentos
Sei forte e com ousadia
Unes alguns fragmentos!

Sono e sonho coligados
Mas que bela reacção,
Amigos enamorados
Onde se prende o coração!

© Maria Graciete Felizardo | 11/2021

terça-feira, 16 de novembro de 2021

FASCÍNIO DAS PALAVRAS ...


Fascínio das palavras...


Fico deveras fascinado
Com algumas palavras
Colho a sua sonoridade
E as alegrias que me são dadas

Há palavras de tão leves
Que me entram nos ouvidos
São palavras do mais alegres
Que despertam meus sentidos

Nota-se nelas sua frescura
E também a luminosidade
São aquelas que se procura
Para nos darem serenidade

Mas também há as pesadas
Palavras que são doridas
Poucas são por mim amadas
Por não dizerem coisas queridas

Exceptua-se deste tipo
As palavras amorosas
O amor é tão bonito
Em palavras tão airosas

É assim que eu construo
O que eu considero poesia
Em quaisquer jamais amuo
As palavras dão-me alegria

© Armindo Loureiro | 11/2021

domingo, 7 de novembro de 2021

NATAL


COROA de SONETOS NATAL


Autores: RAADOMINGOS, Ró Mar
e ARIEH NATSAC

 
Fotografia de Ró Mar 


Soneto 18 de William Shakespeare


Se te comparo a um dia de verão
És por certo mais belo e mais ameno
O vento espalha as folhas pelo chão
E o tempo do verão é bem pequeno.

Às vezes brilha o Sol em demasia
Outras vezes desmaia com frieza;
O que é belo declina num só dia,
Na terna mutação da natureza.

Mas em ti o verão será eterno,
E a beleza que tens não perderás;
Nem chegarás da morte ao triste inverno:

Nestas linhas com o tempo crescerás.
E enquanto nesta terra houver um ser,
Meus versos vivos te farão viver.

William Shakespeare

* * * * *

NATAL


I

"Meus versos vivos te farão viver"
E seres todos os dias celebrado
Como hino! O louvor p'lo renascer
Do coração de todo o humanizado.

Teu semblante é sonho a conquistar,
Neste descompassado casarão,
Onde o destempero se ousa embalar
Pela velha canção da eterna união!

A mão, que s' entrelaça numa flor,
Transparece o dia mais quente do ano -
Natal, sopra letrinhas com mui amor...

És estação do Sol no meu piano,
Que consoa no colorido do serão
"Se te comparo a um dia de verão"!

© Ró Mar

*

II

"Se te comparo a um dia de verão"
Com mais calor humano que beleza
Vejo o mundo p’ra além da criação
Despertando na mais triste pobreza

Há olhos marejados sem ter pão
Olhando o firmamento sem ver nada
Julgando tudo, ser uma traição
Onde existe tanta face descorada

Paz podre num cabaz imaginário
E as doze badaladas no campanário
Recolhe-nos ao mundo bem pequeno

Natividade, Natal, papai noel
Não importa sequer a cor da pele
"És por certo mais belo e mais ameno."

© ARIEH NATSAC

*

III

"És por certo mais belo e mais ameno",
Se a Humanidade absorver o teu advento.
A graça está no simples, no sereno;
O presépio é luz, contentamento!

Louvado seja sempre o simbolismo
Que de esperança se vista o menino.
Não surja desta quadra consumismo;
"Navidad" é celebrar o divino!

Descalça as pantufas, calça o sapato;
Procura a celebração duradoura.
Busca o espírito e copia o retrato!

Quem não acolhe com fé a manjedoura
É ar que arreia o sentido cristão...
"O vento espalha as folhas pelo chão"!

© RAADOMINGOS

*

IV

"O vento espalha as folhas pelo chão"
E o céu ilumina o verde pinheiro,
Numa estrela maior, anil ascensão,
Que guia os passos dum sino caseiro;

Eis, que brota a inspiração verdadeira,
Os troncos revestidos de beleza!
Há cores, emoções e uma lareira
Acesa para aquecer qualquer mesa;

Há vida, cheiros de anciãs tradições
E o presépio com imagens divinas;
Em todas as casas há recordações!

Nas ruas há luz e também, tristes sinas,
Quem só tem a graça do "Nazareno"
"E o tempo do verão é bem pequeno"!

© Ró Mar

*

V

“E o tempo de verão é bem pequeno”
Nada visto com quem nasceu no dia,
De Natal, luz de olhar meigo e sereno
Que iluminou o mundo em letargia

A pequenada não se vai conter
O brilho é demais no seu olhar
A história colorida do nascer
Até diferente quando o sol raiar

A pobreza o desnorte a solidão
De quem soluça lágrimas que vão
Decorando passeios de agonia

Passaporte sem festas, pesadelos
Nas calçadas são chãos de paralelos
“Às vezes brilha o sol em demasia”.

© ARIEH NATSAC

*

VI

"Às vezes brilha o Sol em demasia"
Para os que têm a barriga cheia!
Há tantos com ela meia vazia;
Mas, o que lhes importa a vida alheia?

Se a tal providência se encarregasse
De lhes dar o que ao faminto dá;
Quem sabe se também não lhes tocasse,
O que se passa do lado de cá!

Magoa a indiferença nesta data;
Chama que acendia sem combustão;
Dor agonizante que corrói e mata!

A luz que lhes aquece o coração;
Por vezes não suaviza a tristeza;
"Outras vezes desmaia com frieza"!

© RAADOMINGOS

*

VII

"Outras vezes desmaia com frieza"
No telhado do lúgubre casebre.
É o tempo que lhe inflige a dureza;
O mesmo, que taciturno a recebe!

Da molécula cristalina e pura
Tem medo que a casa, sua, lhe quebre!
Banham lágrimas a ingénua candura,
No rosto rosado cheio de febre!

Pede na natalina reflexão
Muito pão, uma vida bem melhor;
Sonhos que lhe ocorrem do coração!

Talvez alguém superior, maior,
O ouvisse e lhe trouxesse o que fugia;
"O que é belo declina num só dia"!

© RAADOMINGOS

*

VIII

“O que é belo declina num só dia”
Depois vai-se começa a dura guerra
Do faz de conta obra que atrofia
As belezas já mortas nesta terra

Abrem-se tantos olhos macerados
Pelo poder faminto de quem ferra
Os dentes nos mais injustiçados
Mas, porém, nesta época se enterra

Nos louros doentios sem ter paz
Afogado em beleza de um cabaz
Posto na mesa como uma franqueza

Que se vai refletir naquela noite
Gelada e fria áspero açoite
“Na terna mutação da natureza”.

© ARIEH NATSAC

*

IX

“Na terna mutação da natureza"
Anunciando o dia da verdade
É dezembro aparece com certeza
Tempo novo uma nova claridade

Natal, dia risonho em cada rosto
O menino nasceu aja alegria
E para todo o mundo foi exposto
Perante o regozijo de Maria

Uma estrela no alto anunciou
Que nascera o rei e se tornou
Um sábio menino meigo e terno

Que teria uma vida atormentada
Enfrenta dolorosa caminhada
"Mas em ti o verão será eterno."

© ARIEH NATSAC

*

X

“Mas em ti o verão será eterno,”
Quando o homem quiser será melhor
E mesmo que se torne um subalterno
Dos seus dias que passam sem amor

Os fracassos ressaltam sem questão
Oriundo das guerras sem memória
Que passam lado a lado em confusão
E ao longo dos séculos sem glória

Tanto dia sombrio passei longe
Dessas multidões, feito um quase monge
Dizendo p’ra comigo o que farás

Perdido sem ver luzes só o escuro
Mas o tempo mudou, não esconjuro
“E a beleza que tens não perderás”.

© ARIEH NATSAC

*

XI

"A beleza que tens não perderás"!
Renova o teu interior, dá-te inteiro!
Se fores essa luz não morrerás!
Renascer é caminho verdadeiro!

Perdure no presente o mais fecundo
Sentido de fé, paz e compreensão!
Que cada um plante o melhor neste mundo;
Flores de princípios sem exceção.

Nascerá uma esplendorosa glória;
Amor fraterno, jardim colossal,
Doce corolário, feliz vitória!

Sublime seja o coro de Natal;
Uníssono! Se não soar ao inferno
"Nem chegarás da morte ao triste inverno"!

© RAADOMINGOS

*

XII

"Nem chegarás da morte ao triste inverno,"
Para aquecer os pobres corações,
Se não cultivares o amor fraterno!
És Natalício se houver afeições!

Nestas alturas é que pensamos
No verdadeiro sentido da vida,
Pena nele não nos debruçarmos
No dia a dia, sararia muita ferida!

O planeta urge a tua real presença,
Agora e sempre, em ponto de igualdade
Para com todos, na saúde e na doença!

Na alegria e tristeza és celebridade!
Na nossa terra (tua) (re)nascerás,
"Nestas linhas com o tempo crescerás."

© Ró Mar

*

XIII

"Nestas linhas com o tempo crescerás"
E os sinos celebrarão em alegria;
Repicarão em sintonia voraz,
Acentuando na história este dia!

Entoarão ao mundo o nascimento
Cantando em dobre toda sua glória;
O quão notório é o sentimento;
Que profundo viva em nossa memória!

Nascer para viver em padecimento,
Quando creio que na morte viverás;
É difícil o nosso entendimento!

Mas veio ao mundo por nós! Salvarás!
E agora? Interrogo-me a sofrer;
"E enquanto nesta terra houver um ser"?

© RAADOMINGOS

*

XIV

"E, enquanto nesta terra houver um ser"
À tua semelhança haverá guarida
P'ra procriar e esperança de viver
Numa natureza de terra erguida!

Ah, estrela guia, que a tua luz não se apague
Antes de encaminhar todo o rebanho!
Neste labirinto de ziguezague
Havemos de encontrar a paz e o ganho!

Alvissaras! Nasceu o Jesus Menino!
E, o dia faz-se o mais bonito do ano,
Tocam sinos em duo de violino...

Prenúncio afinado do meu piano,
Clave de Sol, por no "Salvador" crer!
“Meus versos vivos te farão viver.”

© Ró Mar

*

COROA de SONETOS NATAL

Autores: RAADOMINGOS, Ró Mar
e ARIEH NATSAC

*

Sonetos do Universo | 2021

quinta-feira, 4 de novembro de 2021

O MILENAR COMETA!


Fotografia de Ró Mar 


O MILENAR COMETA!


Ah, ousando louvar o mor nobre Poeta,
Numa alma violeta, hei de o homenagear!
Num breve escrevinhar, a fórmula secreta
Há de ser descoberta e a quero divulgar!

Porque posso sonhar! O milenar cometa,
Que tenho como meta! Esta arte de poetar,
Encaixada a rimar, faz rolar a caneta
Numa escrita concreta! Ah, hei de o conquistar!

E, por tanto o amar exponho o coração
Numa linda canção, que s' esvoaça em berço
Rendilhado a verso orlado d' emoção;

Aos céus chegarão os dias que converso,
P'lo planeta disperso, orando por paixão
E honrando o padrão dos "Sonetos do Universo"!

© Ró Mar | 10/ 2021